Amado, porem afligido – Sermão Nº 1518

Nº 1518

Sermão pregado a uma audiência de damas inválidas

por Charles Haddon Spurgeon,

em Mentone, França,

sem data registrada

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“Senhor, eis que está enfermo aquele que tu amas.” João 11:3

Aquele discípulo a quem Jesus amava não está de nenhuma forma relutante ao registrar que Jesus também amava a Lázaro: Não existem ciúmes entre aqueles que são eleitos pelo Bem amado. Jesus amava Maria, Marta e Lázaro: é algo feliz quando uma família inteira vive no amor de Jesus. Era um trio favorecido, e, no entanto, como a serpente entrou no Paraíso, assim também a aflição entrou na tranquila casa de Betânia.

Lázaro estava enfermo. Todos eles sentiam que se Jesus estivesse ali, a enfermidade fugiria de Sua presença; então, que outra coisa deveria fazer, senão notificar e Jesus sua tribulação? Lázaro encontrava-se às portas da morte, logo, suas amorosas irmãs reportaram imediatamente sua aflição a Jesus, dizendo-lhe: “Senhor, eis que está enfermo aquele que tu amas.”

Desde ai, essa mesma mensagem tem sido enviada muitas vezes a nosso Senhor, já que em muitíssimos casos, Ele tem escolhido Seu povo em forno de aflição. Do mestre se diz: “Ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e as nossas dores levou sobre si”, então, nesse assunto não é algo extraordinário que os membros sejam conformados a sua Cabeça.

I. Observem, primeiro, UM FATO que é mencionado no texto: “Senhor, eis que está enfermo aquele que tu amas.” As irmãs estavam um tanto surpreendidas de que assim fora, pois a expressão “eis que” implica certo grau de surpresa. “Nós o amamos, e queríamos sarar-lhe diretamente: Tu o amas, e, no entanto, permanece enfermo. Tu poderias sarar-lhe com uma palavra, então, por que motivo aquele que amas está enfermo?”

Querido amigo doente, não se tem perguntado frequentemente como que sua dolorosa e persistente doença pode ser consistente com o fato de ser eleito, chamado, e ser um com Cristo? Atrever-me-ia dizer que isso lhe deixa grandemente perplexo, e com toda verdade, não é de nenhuma maneira estranho, antes, é algo que se deve esperar.

Não deveria surpreender que o homem a quem o Senhor ama esteja enfermo, pois é só um homem. O amor de Jesus não nos separa das necessidades e das debilidades comuns da vida humana. Os homens de Deus seguem sendo homens. O pacto da graça não é uma carta de privilégio que nos exime da tuberculose, do reumatismo, ou da asma. Os males corporais, que nos sobrevém por causa de nossa carne, nos acompanharão até a tumba, pois Paulo disse: “Os que estamos nesse tabernáculo gememos.”

Aqueles a quem o Senhor ama, são mais propensos a adoentar-se, pois estão debaixo de uma peculiar disciplina. Está escrito: “Porque o Senhor ao que ama, disciplina, e açoita a todo o que recebe por filho” A aflição de qualquer tipo é um dos sinais dos filhos verdadeiramente nascidos de Deus, e sucede com frequência que a prova toma a forma de enfermidade. Haveria de nos surpreender, então, que tenhamos que tomar nosso turno no leito da enfermidade? Se Jó, Davi e Ezequias, em seu momento, tiveram que se sofrer, quem somos nós pára espantar-nos porque nos encontramos sofrendo de má saúde?

Tampouco deveria nos surpreender que fiquemos doentes, se refletirmos no grandioso benefício que flui da prova para nós. Eu não sei qual perfeição peculiar foi trabalhada em Lázaro, porem, muitos discípulos de Jesus teriam sido de pouca utilidade se não tivessem sido afligidos.

Os homens fortes são sujeitos a serem duros, mandões e indiferentes, e, portanto, necessitam ser colocados e fundidos no forno. Conheci certas mulheres cristãs que nunca teriam sido tão delicadas, ternas, sábias, experimentadas e santas se não houvessem sido abrandadas pela dor física.

Há frutos no jardim de Deus, tal como no jardim humano, que não amadurecem enquanto são sejam golpeados. Jovens mulheres que são propensas a serem voláteis, altivas ou tagarelas, frequentemente são treinadas por várias enfermidades para que estejam cheias de doçura e luz, e dessa forma, são ensinadas a sentar-se aos pés de Jesus. Muitas delas têm sido capazes de falarem com o salmista: “Foi-me bom ter sido afligido, para que aprendesse os teus estatutos.” Por essa razão, inclusive aqueles que são favorecidos e benditos entre as mulheres, podem sentir que uma espada atravessa seus corações.

Muitas vezes está enfermidade dos amados do Senhor é para o bem de outros. A Lázaro se lhe deixou que enfermasse e morresse, para que por sua morte e ressurreição, os apóstolos fossem beneficiados. Sua doença foi “para glória de Deus.”

Ao largo de todos esses mil e novecentos anos que transcorreram desde a enfermidade de Lázaro, todos os crentes têm obtido um bem dela, e essa tarde, todos estamos tanto melhor porque Lázaro definhou e morreu. A igreja e o mundo podem extrair um imenso benefício das aflições dos homens bons: os descuidados podem ser despertos, os que duvidam podem ser convencidos, os ímpios podem ser convertidos, e os enlutados podem ser consolados através de nosso testemunho na enfermidade: e, se é assim, desejaríamos evitar a dor e a debilidade? Acaso não estamos muito dispostos a que nossos amigos digam de nós: “Senhor, eis que está enfermo aquele que tu amas”?

II. No entanto, nosso texto não só registra um feito, mas antes menciona um RELATÓRIO desse feito: as irmãs enviaram e o contaram a Jesus. Temos de manter uma correspondência constante com nosso Senhor acerca de tudo.

“Canta-lhe um hino a Jesus

Quanto teu coração desfaleça

Conta tudo a Jesus,

Teu júbilo ou tua queixa”

Jesus sabe tudo sobre nós, porem experimentamos um grande alívio quando derramamos nossos corações diante Dele. Quando os angustiados discípulos de João Batista viram seu líder decapitado, “tomaram o corpo e o enterraram; e foram e deram as novidades a Jesus.” Não teriam podido fazer algo melhor. Em todo problema que tenham, devem enviar uma mensagem a Jesus, e não guardem seu abatimento dentro de vocês mesmos. Tratando-se Dele, não há necessidade de nenhuma reserva, não há temor de que os trate com fria altivez, ou com implacável indiferença, ou com cruel deslealdade. Ele é um confidente que nunca nos trairá, um amigo que nunca nos lançará fora.

Contamos com uma alentadora esperança que nos motiva a contar tudo a Jesus: que seguramente Ele nos ajudará. Se você apela a Jesus, e lhe diz: “Senhor, tão cheio de graça, por que estou enfermo? Eu pensava que era útil para Ti enquanto gozava de saúde, e agora não posso fazer nada; por que sucede isso?” então poderia ser do agrado Dele mostrar-lhe o porquê, ou, se não, fará que estejas disposto a submeter-se com paciência à Sua vontade, ainda que não saiba os motivos. Ele pode transmitir Sua verdade a sua mente para animar-lhe, ou fortalecer seus corações com Sua presença, ou ainda enviar-lhe inesperados consolos e conceder que se glories em suas aflições. “Derrame diante Dele vosso corações; Deus e nosso refúgio.” Não em vão Marta e Maria enviaram recado a Jesus, e não é em vão alguém buscar Sua face.

Recordem, também, que Jesus pode curar. Não seria sábio viver por uma suposta fé, e rejeitar ao médico e suas medicinas, como tampouco seria sábio descartar ao açougueiro ou ao alfaiate, ou espera ser alimentado e vestido por fé; porem, isso seria muito melhor que esquecer por completo ao Senhor, e confiar unicamente no homem. A saúde, tanto para o corpo como para a alma, há de se buscar em Deus. Fazemos uso de remédios, porem, esses não podem fazer nada aparte do Senhor, “que sará a todas nossas dolências”. Podemos contar a Jesus nossas dores e sofrimentos, nosso declines graduais e nossa tosse desgarrradora. Algumas pessoas têm medo de acudir a Deus no tocante a sua saúde: pedem pelo perdão do pecado, porem não se atrevem a perdi ao Senhor que lhes tire uma dor de cabeça: e, no entanto, em verdade, se os cabelos da nossa cabeça estão todos contatos por Deus, nos implica uma maior condescendência de parte Sua aliviar as palpitações e as pressões que temos dentro de nossa cabeça. Nossas grandes coisas serão muito pequeninas para o grandioso Deus e nossas coisinhas não poderiam ser menores.

É uma prova a grandeza da mente de Deus, que enquanto governa os céus e a terra, não está tão absorto nesses grandes assuntos como que para esquecer a dor mais minúscula ou a menor necessidade de qualquer de Seus pobres filhos. Podemos correr a Ele no tocante a nossa respiração dificultosa, pois Ele nos deu primeiro os pulmões e a vida. Podemos contar a Ele sobre nossos olhos que perdem vigor, e acerca de nossos ouvidos que perde audição, pois Ele fez a ambos. Podemos mencionar-lhe o joelho inflamado, o dedo enrugado, o torcicolo ou pé torcido, pois Ele fez todos esses nossos membros, e os redimiu todos, e os ressuscitará todos da tumba. Vão de imediato, e digam-Lhe: “Senhor, eis que está enfermo aquele que tu amas”

III. Em terceiro lugar, no caso de Lázaro, temos de advertir UM RESULTADO que nós não teríamos esperado. Sem dúvida, quando Maria e Marta enviaram mensagem para dizer a Jesus, elas esperavam ver a recuperação de Lázaro tão pronto como o mensageiro chegasse a Jesus, porem, não foram contempladas. Durante dois dias o Senhor permaneceu no mesmo lugar, e não foi até Betânia. Até que soube que Lázaro tinha morrido, ai que falou de ir a Judéia.

Isso nos ensina que Jesus pode ser informado de nosso problema, e, no entanto, poderia atuar como se fosse indiferente ao mesmo. Não devemos esperar em cada caso que a orações pela recuperação será atendida, pois se assim fosse, ninguém que tivesse um bebê ou um menino, ou um amigo ou conhecido que orasse por ele, morreria.

Em nossas orações pelas vidas dos amados filhos de Deus, não devemos esquecer que há uma oração que poderia estar cruzando com as nossas, pois Jesus ora: “Pai, aqueles que me há dado, quero que onde eu estou, também eles estejam comigo, para que vejam minha glória.” Pedimos que permaneça conosco, porem quando reconhecemos que Jesus os quer lá em cima, o que podemos fazer se não admitir seu direito superior, e falar: “Não seja como queremos, mas como Tu quer.”

Em nosso próprio caso, podemos perdi ao Senhor que nos levante, e, no entanto, ainda que nos ama, poderia permitir que ficássemos pior e pior, até que ao fim, morramos. À vida de Ezequias lhe foram acrescentados 15 anos, mas nós talvez nem mesmo consigamos a prorrogação de um só dia. Nunca dê tanta importância à vida de alguém muito querido para você, e nem a sua própria vida, como para rebelar-se em contra do Senhor. Se defendesse a vida de qualquer ser querido com uma mão demasiadamente firme, então estaria fazendo uma vara para suas próprias costas; e se amasses em demasia a sua vida terrena, estaria tecendo uma almofada cheia de espinhos para seu leito de morte.

Os filhos, muito frequentemente, são ídolos, e em tais casos, seus ardentes amantes são idolatras. Se adorarmos nossos semelhantes, é como se fizéssemos um deus de argila e o adorássemos, igual como fazem os hindus, pois, que coisa são eles, se não barro? Será o pó tão querido para nós que repliquemos com nosso Deus por sua causa? Se nosso Senhor permite que soframos, não deveríamos nos queixar. Ele fará para nós o que seja mais benéfico e o melhor, pois nos ama mais do que nós amamos a nós mesmos.

Parece-me que lhe ouço falar: “Sim, Jesus permitiu que Lázaro morrera, porem, o ressuscitou de novo”? Eu respondo, Ele é a ressurreição e a vida para nós também. Consolem-se no que concerne aos que tem partido: “Teu irmão ressuscitará”, e todos aqueles de entre nós cuja esperança está em Jesus, participaremos na ressurreição de nosso Senhor. Não somente viverão nossas almas, mas também nossos corpos serão ressuscitados incorruptíveis. A tumba servirá de crisol e esse vil corpo se levantará sem ser já vil.

Alguns cristãos são grandemente animados pelo pensamento de viver até que o Senhor venha, e assim escapar da morte. Eu confesso que creio que isso não é uma grande ganância, pois longe de ter alguma preferência sobre aqueles que morreram, os que vivem e permanecem até Sua vinda perderão um ponto de comunhão, ao não morrer e ressuscitar como seu Senhor.

Amados, tudo é de vocês, e a morte é expressamente mencionada na lista; portanto, não tenham medo dela, mas antes:

“Anelem a noite, para se despir,

e que possam descansar com Deus”

IV. Concluirei com UMA PERGUNTA: “Amava Jesus a Marta, e sua irmã, e Lázaro”; Jesus lhe ama num sentido especial? Ai, muitos enfermos não possuem nenhuma evidência de algum amor especial de Jesus para com eles, pois nunca buscaram Seu rosto, nem tem confiado Nele! Jesus poderia declarar-lhes: “Nunca os conheci”, pois eles têm dado para trás com Seu sangue e Sua cruz.

Querido amigo, responde a seu próprio coração essa pergunta: “Amas a Jesus?” Se o amas, o amas porque Ele lhe amou primeiro. Está confiado Nele? Se você confia Nele, essa sua fé é a prova que Ele lhe tem amado desde antes da fundação do mundo, pois a fé é o sinal pelo qual promete Sua fidelidade a Seu amado.

Se Jesus lhe ama, e está enfermo, que todo o mundo veja como você glorifica a Deus em sua enfermidade. Os amigos e as enfermeiras hão de ver como os amados do Senhor são animados e consolados por Ele. Sua santa resignação há de assombrar-los, e conduzir-lhes a admirar a seu Amado, que é tão cheio de graça para contigo, e que lhe faz feliz na dor e lhe dá gozo às portas do sepulcro.

Se sua religião tem algum valor, deveria apoiar-se agora, e então, forçará aos incrédulos a ver que aquele a quem o Senhor ama está em uma melhor condição quando está enfermo, que os ímpios quando estão cheios de saúde e vigor.

Se não sabes que Jesus te ama, careces da estrela mais resplandecente que possa alegrar a noite da enfermidade. Espero que não morras como está agora, e passes ao outro mundo sem gozar do amor de Jesus: essa seria em verdade uma calamidade terrível. Busca Seu rosto de imediato, e pudera ser que sua atual enfermidade fora uma parte da faceta do amor pelo quão Jesus quer atrair-lhe a Ele. Senhor, sara todos esses enfermos na alma e no corpo. Amém.

FONTE

Traduzido de http://www.spurgeon.com.mx/sermon1518.html

Todo direito de tradução protegido por lei internacional de domínio público e com permissão

 

Sermão nº 1518—Volume 26 do The Metropolitan Tabernacle Pulpit,

Original em inglês: BELOVED AND YET AFFLICTED

Tradução Armando Marcos

Capa: Beatriz Rustiguel