A Membresia da Igreja – Sermão Nº 3411

CAPA a membresia da igrejaNº 3411

Sermão pregado na noite de 24 de Outubro de 1869

por Charles Haddon Spurgeon

No Tabernáculo Metropolitano, Newington, Londres.
E publicado em 18 de Junho de 1914

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“E não somente fizeram como nós esperávamos, mas a si mesmos se deram primeiramente ao Senhor, e depois a nós, pela vontade de Deus. 2 Coríntios 8:5.”

Algumas pessoas estão tratando sempre de comprovar o que é costume na igreja cristã. Em todo o tempo, estão buscando exemplos e precedentes. O pior do caso é que muitas dessas pessoas buscam coisas antigas que não são suficientemente antigas; as coisas antigas da Igreja de Roma, por exemplo, seus costumes e ordenanças medievais, que não são outra coisa senão um autêntico disparate. Se quisessem coisas verdadeiramente antigas e sólidas, elas deveriam regressar aos tempos apostólicos. O melhor livro de história da Igreja para fazer cópia do ritual, do verdadeiro ritual, é o livro dos Atos dos Apóstolos, e quando a Igreja cristã apelar para esse livro, ao invés de inquirir sobre o que os cristãos primitivos dos séculos dois e três fizeram, então sim, se aproximarão muito mais do real conhecimento do que devem fazer.

Agora, nosso texto nos fala de um antigo costume dos dias dos apóstolos. Aqueles que se convertiam em cristãos se entregavam primeiramente ao Senhor, e logo em seguida se entregavam à Igreja, de acordo com a vontade de Deus. Vamos ponderar essas coisas na sua ordem. Claro que iremos refletir primeiro sobre o ponto central e mais importante: esta ação de valor e beleza a tudo que segue e é seu fruto:

I. A CONSAGRAÇÃO SUPREMA DA ALMA.

A primeira coisa que os cristãos originais fizeram, os cristãos dos tempos antigos e do Espírito Santo, foi que: “a si mesmos se entregaram primeiramente ao Senhor”. Isso é vital, é a oferenda de maior importância. Nós todos que professamos ser discípulos de Cristo realmente temos nos entregado a Deus? Não existe nessa casa de oração alguns que jamais pensaram em fazer isso, e inclusive alguns que rejeitariam com desprezo a simples ideia de fazê-lo?

Ó meus leitores, o dia virá quando vocês contemplarão esses assuntos sob uma luz muito diferente, e no mundo vindouro, se descobrirá que se entregar ao Senhor teria sido sua mais alta sabedoria, e que ter vivido para o ego foi sua suprema tolice.

Quando esses primeiros cristãos se entregavam ao Senhor, a primeira coisa manifesta era que esta consagração e entrega eram sinceras. Se alguns dos aqui presentes se entregaram ao Senhor, deveriam se perguntar se sua consagração foi sincera. Esses crentes primitivos levavam a sério aquilo que afirmavam, uma profunda realidade estava contida em sua consagração: entregavam-se a Jesus Cristo para serem inteiramente Dele.

Recordem que naqueles tempos isso significava sofrer muito mais do que jamais deveremos sofrer agora. Um homem que se entregava a Cristo naqueles dias era expulso da sinagoga se fosse um judeu, e era proscrito da sociedade se fosse um pagão. Ele era arrastado aos tribunais; era frequentemente lançado à prisão; com igual frequência era golpeado com muitos açoites, em muitos casos era executado, sendo queimado ou atravessado pela espada. Porém, esses primeiros cristãos conheciam o que haveriam de passar, e, apesar disso, entregavam-se ao Senhor resolutamente.

Ó amados professos aqui presentes, sua consagração a Cristo foi tão sincera como essa, ou simplesmente vieram e fizeram uma profissão de fé porque outros a fizeram, e perseveraram nessa profissão – tendo sido uma mentira – porque não suportavam a vergonha de confessar que tinham cometido um erro? Ó, a profissão é sincera ou não? Se não é, que Deus a converta em sincera, pois somente a profissão que vem do coração é a que permanecerá no último dia do grande juízo. Senhor, livra-nos de ter uma religião desprovida de coração!

A consagração deles ao Senhor foi, continuando, uma consagração voluntária. Todos os soldados de Cristo são voluntários, e, no entanto, todos eles são homens forçados. A graça de Deus constrange aos homens para se converterem em cristãos, no entanto, unicamente os constrange sendo consistente com as leis de suas mentes. A liberdade da vontade é uma verdade tão grande como o é a predestinação de Deus. A graça de Deus, sem violar nossas vontades, faz com que os homens estejam dispostos no dia do poder de Deus, e então se ofereçam a Cristo Jesus.

Você não pode ser um cristão contra sua vontade. Como isso poderia ser? Um servo de Deus que não o queira ser! Um filho de Deus que não quer sê-lo! Não, nunca foi assim e nunca será. Aqui e agora, a vocês cristãos, perguntar-lhes-ei, vocês não são os alegres, gozosos e, incondicionalmente, servos de Deus? Eu sei que o são, e esse vínculo que estabeleceram há anos não é agora cansativo para vocês, e se vocês são santos genuínos, vocês o renovam essa noite, e esperam repetir esse compromisso na vida e na morte, pois de forma voluntária e alegre vocês pertencem ao Senhor.

A consagração que esses primeiros cristãos fizeram foi, continuando, uma consagração inteligente. Nos dias de Paulo, não eram recebidas na igreja pessoas sem inteligência. Elas sabiam que nenhum apadrinhamento poderia ser útil ali. Elas sabiam – e alguém poderia pensar que todas as pessoas racionais deveriam saber – que a religião de Jesus Cristo não pode existir onde não existe uma clara compreensão da verdade salvadora.

Unicamente pode existir vida espiritual e verdadeira conversão onde o entendimento foi capaz de compreender o ofício salvador de Jesus. Nenhum rito religioso, cerimônia ou ordenança poderiam conferir isso. Eu escutei alguns ministros que dizem para suas congregações: “vocês foram feitos cristãos em sua infância e devem ser fiéis aos compromissos que foram feitos naquele momento em seus nomes”. Em verdade, a consciência de todo homem lhe diz que não existe nem uma sombra de base para um raciocínio assim. O que eu tenho a ver, ou o que me importam os votos que foram feitos em meu nome quando eu era um nenê? Tenham sido bons ou maus, eu nunca fui consultado sobre eles e não tenho nada a ver, nem terei a ver, com eles. Seja que prometeram que eu serviria a Deus ou que eu serviria ao demônio, rejeito igualmente a responsabilidade e o apadrinhamento deles.

Como um ser inteligente, eu falo por mim mesmo diante de Deus, e ninguém deverá falar por mim. Se eu tivesse sido consagrado a Moloque, eu deveria aceitar essa consagração em minha idade adulta? Deus não o queira! E ainda se eu tivesse sido consagrado a Cristo, não aceitarei uma consagração que eu sei que Cristo nunca aceitou, porque Ele nunca a pediu. Ele pede minha consagração pessoal; Ele unicamente pede um amor inteligente, um serviço inteligente, e eu, em verdade, confio que muitos de vocês vieram a Cristo sabendo o que faziam, sabendo o que significava o arrependimento, sabendo o que queria dizer a fé, tendo considerado o custo que representaria uma vida de santidade, e logo, resolutamente, como homens de juízo e entendimento, disseram: “ó Príncipe, nos alistamos sob Teu estandarte. Ó Emanuel, escreve nossos nomes em Teu regimento, pois seremos Teus servos desde agora e para sempre!”. Foi uma entrega sincera, foi uma entrega voluntária e foi uma entrega inteligente essa que os primeiros cristãos fizeram ao Senhor.

Ademais, meus irmãos e irmãs, eles realizaram uma entrega completa. Nenhum cristão dos tempos antigos deu-se parcialmente ao Senhor e parcialmente se reservou aos ídolos, ou para si mesmo; e se alguém tivesse tentado fazer isso, teria sido rejeitado, pois na igreja está vigente a regra de Cristo que Ele terá tudo ou nada. Como cristão você deve ser inteiramente cristão ou não será cristão em absoluto. Não existe tal coisa como repartir-se entre Deus e o diabo, entre a justiça e o pecado. A entrega deve ser sem reservas e sem limite.

Se vocês se entregaram verdadeiramente ao Senhor, entregaram-Lhe seus corpos, para que esses já não fossem mais contaminados pelo pecado, mas para que fossem templos do Espírito Santo. Deram-Lhe sua mente, para já não serem livres pensadores que buscam o alardeado livre pensamento dos escravos do ceticismo. Entregaram suas faculdades para se sentar com elas aos pés de Cristo, para aprender Dele, para receber Seus ensinos como verdade e Sua palavra como a única corte de apelações para todas as controvérsias. O aceitam como seu mestre mais além de toda disputa e aceitam Sua doutrina como uma verdade pura para vocês. Também Lhe entregaram sua língua para falar por Ele, suas mãos para trabalhar para Ele, seus pés para caminhar ou correr por Ele: entregaram cada uma das faculdades do corpo e da mente em formosa associação para o serviço Dele.

Em relação à sua natureza nascida de novo, angélica e espiritual, essa natureza deve ser enfaticamente do Senhor, e sempre será o real poder que reina interiormente. Vocês são hoje, na trindade de sua natureza: corpo, alma e espírito, completamente de Cristo, e isso inclui – se são cristãos sinceros – tudo o que possuem: todos os talentos, todo o tempo, todas as propriedades, toda a influência, todas as relações e todas as oportunidades. Consideram que não possuem nada a partir desse momento, mas sim que falam como a esposa: “eu sou do meu amado, e meu amado é meu”.

Ademais, a entrega que cada verdadeiro crente realiza é uma entrega ao Senhor. Aqui, meus irmãos, é onde se deve começar: com o Senhor. Não devemos nos entregar à Igreja até que tenhamos nos entregado ao Senhor. E jamais deve ser uma entrega aos sacerdotes. Ó, desdenhem isso! De todos os seres desprezíveis que vivem, os piores são os sacerdotes. De todas as maldições que caíram alguma vez sobre a terra – e não irei excetuar nem mesmo o diabo – a pior é o sacerdócio, e não me importa se ele leva a veste do ministro Dissidente, ou é um clérigo da Igreja Estabelecida ou da Igreja Católica Romana, ou é um muçulmano ou pagão. Ninguém pode fazer sua religião por você. Se alguém pretende que assim pode fazê-lo, ou que pode perdoar seu pecado, ou fazer algo diante de Deus, deixe-o de lado: é um vil impostor. Jamais submeta seus pensamentos ou sua mente a algum homem. Não pendure opiniões nas mangas do casaco de ninguém.

É ao Senhor que vocês devem fazer sua entrega completa e incondicional: façam sua entrega à Sua verdade, à Sua lei, ao Seu Evangelho, de maneira tão completa como se fossem escravos, ou uma pedra que deve ser talhada por Suas mãos. Vocês serão elevados em dignidade, na medida em que seu ego afunde. Vocês se converterão em livres, na proporção que levem as ataduras de Deus. Vocês se converterão em grandes, conforme se voltem pequenos em si mesmos. Entreguem-se completamente a Deus. Assegurem-se de que a entrega seja a Ele e não a algum homem, algum credo, alguma denominação, mas sim completa e inteiramente ao Senhor, que os amou desde antes da fundação do mundo; ao Senhor, que os comprou com o sangue de Seu coração; ao Senhor, cujo Espírito selou dentro de suas almas sua adoção.

Prestem atenção a isso, então, registrem como primeiro passo em todos os atos públicos da religião: vocês devem se entregar primeiro ao Senhor. Vocês não possuem o direito de falar sobre se unir a uma igreja cristã, enquanto não tiverem feito isto: “primeiro ao Senhor”. Não possuem o direito de serem batizados, enquanto não tiverem feito isto: “primeiro ao Senhor”. Não possuem o direito de se sentarem à mesa da comunhão, enquanto não tiverem feito isto: “primeiro ao Senhor”. Entreguem-se primeiro ao Senhor: com um verdadeiro arrependimento do pecado e uma simples e sincera confiança em Jesus, e então, com uma completa consagração ao Senhor, vocês podem vir a qualquer ato sagrado de serviço, a cada privilegiado festim de amor, mas não até então.

Ó senhores, Deus aborrece seus sacramentos e suas cerimônias enquanto não Lhe tiverem entregado primeiro seus corações. Vãs são suas oblações; seu incenso é uma abominação para Ele. É algo mal e pior ainda que algo mal; seria uma zombaria para Deus, um insulto para Ele, se seu coração não se rendesse a Jesus, e sua natureza humana não se tornasse legítima propriedade de Deus, mediante sua voluntária entrega do coração a Ele!

Não posso forçar esse assunto questionando cada um dos presentes, mas, no entanto, gostaria de pedir a cada consciência, especialmente, a cada cristão professo, que responda a esta pergunta: “minha alma, você se entregou, por meio da graça de Deus, para pertencer ao Senhor?”. Fala seriamente ou se trata de uma farsa? Realmente você fez uma entrega real ou é tudo fingimento? Sente dentro de sua alma essa noite um desejo de convertê-la a uma consagração mais completa? Você ora pedindo mais graça para fazer a entrega completa no futuro? Descansa unicamente no precioso sangue de Jesus? Então, você deseja glorificar a Deus, enquanto está nesse corpo? Ó, então tudo vai bem contigo, e pode dar comigo o seguinte passo. Se não for assim, não se aproximem das ordenanças, não toquem nas promessas! Não existe nada para você na Bíblia e não existe nada na Igreja para você, enquanto você não esteja primeiramente reconciliado com Deus pela morte de Jesus Cristo.

E agora, prossigamos a considerar brevemente a segunda consagração da alma:

II. A ENTREGA QUE SEGUE À CONSAGRAÇÃO SUPREMA.

Quero entender esta passagem corretamente. Creio que a entendo. “a si mesmos se entregaram primeiramente ao Senhor, e logo a nós”; isto é, deram “a si mesmos” a nós, pela vontade de Deus. Depois que um verdadeiro cristão se entregou ao Senhor, o seguinte ato imediatamente é de se entregar à Igreja Cristã; deve tentar imediatamente, como Paulo o fez, unir-se aos irmãos de Cristo. Se houver alguma Igreja cristã em algum lugar do distrito em que vive, o crente recém-nascido deve buscar de imediato a comunhão com os outros que amam o seu Senhor, porque foram salvos por Sua graça.

A forma correta de fazer isso é entregar-se a si mesmo. Não seu nome, não seu dinheiro, não sua mera presença, nem sua simpatia, seus trabalhos ativos: todas essas coisas são parte da entrega; mas a alma de tudo isso radica em entregar-se a si mesmo. Com toda a força e o peso de sua influência, de sua personalidade e habilidade, na medida em que Deus o ajude, você deve se entregar à Igreja.

O que está envolvido nessa entrega de nós mesmos à Igreja cristã? Irei repetir para refrescar a memória de muitos membros daqui que tenham esquecido. É seu dever unir-se à Igreja cristã. O que isso significa? Que deveres se originam disso?

Primeiro está o dever da consistência de caráter. Se vocês não fazem uma profissão de religião e vivem como lhes agrada, terão que responder por isso no último grande dia. Mas se vocês são membros de uma Igreja cristã, tenham atenção de como vivem, pois suas ações podem se tornar duplamente vigiadas, e elas serão duplamente pecaminosas se caírem em inconsistências.

Você é um servo na família e um membro de uma Igreja cristã: não deve existir em você propensão de servir somente quando lhe vigiam; não deve existir nada em você que desonre um bom servo de Jesus Cristo.

Se você é um esposo, não tem o direito de ser um tirano dominante e de mau caráter para com sua esposa; se o é, não deve ser um membro de uma igreja cristã absolutamente. Se você é uma esposa, não deve ser uma mulher desalinhada, preguiçosa, leitora de novelas, que descuida seus deveres familiares; se assim é, não me importa a que classe frequenta ou em quais reuniões você participa; você não tem direito de atuar assim se professa ser uma cristã.

Você diz que é um cristão e é membro da igreja: então em seu negócio você não tem o direito de cair em armadilhas e desonestidade que são comuns em todas as partes. Se você não pode viver sem ser um patife, não seja um professo da religião; seria melhor que fosse ao inferno imediatamente, tal como é, do que ir para lá com uma pedra de moinho atada em seu pescoço por conta de ter feito uma profissão, uma profissão de piedade vil e malvada, que você não exerceu.

Não senhores, se vocês não se esforçarem – na força e espírito da graça de Deus – por alcançar a consistência de uma conduta moral, vocês não terão direito de falar em se entregar à Igreja, para a qual causaria opróbrio. Só pecariam para alcançar uma maior condenação; portanto, não se aproximem da membresia.

O seguinte que é requerido de cada membro da Igreja de Cristo é a assistência aos meios da graça. Não me refiro meramente à assistência ao culto dominical. Qualquer hipócrita vem no domingo, mas até onde sei, nem todos eles vêm em uma segunda-feira na reunião de oração e não vêm ao serviço do dia de semana, que tem às quintas-feiras. Estou muito certo disso, ainda que alguns pudessem vir. As reuniões e os serviços que acontecem no dia de semana são uma poderosa prova. Muitos não podem frequentar, eu sei, e não peço que os deveres domésticos sejam sacrificados, nem mesmo pela adoração pública; mas existem alguns que deveriam estar presentes e não estão, e, em verdade, todos vocês, enquanto têm oportunidades, e morando dentro de uma distância razoável, deveriam frequentar essas reuniões. Tenham cuidado de não se tornarem frouxos a esse respeito.

Outro dever de todos os membros da igreja é ajudar e consolar uns aos outros. Justo como entre os maçons, que dão a mão à maneira dos maçons, e de imediato obtêm uma palavra amável e um reconhecimento fraternal, assim deveria ser entre os cristãos, só que em um sentido mais elevado. Vocês devem consolar os que choram, ajudar os pobres e, em geral, devemos vigiar os mútuos interesses, vendo que, na Igreja, todos somos membros de uma mesma família. Vocês devem “fazer o bem a todos, e especialmente aos da família da fé”. As migalhas devem ser entregues aos pardais que estão fora, mas seus irmãos e irmãs devem receber o maior e o menor do que vocês podem dar. Esse é o claro dever de todo cristão.

Também, todo membro da igreja deve procurar se entregar a ela no sentido de fazer sua parte em toda a obra da Igreja. Que vergonha para o membro da Igreja que não tem uma posição que ocupar, que não é nem generoso com a carteira, nem diligente com sua mão, nem sincero com seu coração nem fala com sua língua. Ninguém pode fazer tudo, mas que cada um há de tomar seu lugar e seu nicho, pois todo aquele que não está fazendo algo, que é senão um zangão na colmeia, que será expelido logo, logo?

Eu creio, meus queridos amigos, poder dizer que fiz isso quando me uni à Igreja de Cristo. Lembro muito bem como me incorporei, pois eu forcei minha entrada à Igreja de Deus, dizendo ao ministro – que era uma pessoa frouxa e lenta – depois de tê-lo buscado quatro ou cinco vezes sem poder vê-lo, que eu já tinha cumprido com meu dever, e se não me concedia uma reunião, eu mesmo convocaria uma reunião da Igreja, e lhes diria que eu creio em Cristo, e lhes pediria que me recebessem. Eu sei que quando eu disse, tinha a intenção de fazê-lo. Eu sei que não existia ninguém entre todos eles que tivesse a intenção de fazê-lo mais intensamente naquele momento, e o digo seriamente.

Eu me entrego a Cristo e à religião de Cristo. Não me importa falar sobre política quando tem que ver com o cristianismo; não me importa cooperar com a causa comum da filantropia, ou com qualquer obra para o bem de meus semelhantes; mas não me entrego de todo coração e espírito a nenhuma obra senão àquela de divulgar o conhecimento do nome de Cristo. Isso, penso dever ser o primeiro e o último para o cristão. Sua religião cobre sua roupa, ou sua roupa cobre seu cristianismo? Qual dos casos é aplicável para você, meu amigo? Você é um político: isso está muito bem; alegra-me que haja um homem honesto em um lugar assim; no entanto, sua religião cobre sua política, ou sua política devora sua religião? Você é um trabalhador; bem, essa é uma posição honrosa, e toda honra deve ser dada ao homem que trabalha duro; porém, sua religião permeia e dá qualidade ao seu duro trabalho? Você ama a Cristo em meio de tudo isso? Sente em todo momento que, sobre tudo, deve ser um cristão? Então não me importa o que seja, quer seja um ferreiro ou um varredor, um rei ou um limpador de chaminés; isso não tem importância. O primeiro e o mais importante é que você seja um cristão, e todo o demais deve se subordinar a isso, pois a Igreja cristã tem o direito de esperar isso.

Agora, eu sei que existe alguns que dizem: “bem, eu espero ter-me entregado ao Senhor, mas não pretendo entregar-me a nenhuma igreja, porque ___________” Agora, por quê não? “Porque posso ser um cristão sem ela”. Você está muito convencido disso? Você pode ser tão bom cristão desobedecendo aos mandamentos de seu Senhor, como se fosse obediente a eles? Bem, suponha que todos demais fizessem o mesmo; suponha que todos os cristãos do mundo dissessem: “eu não me unirei à Igreja”. Então, não existiria uma Igreja visível; não haveria ordenanças. Isso seria algo muito mau e, no entanto, se um o fizesse – o que é correto para um é correto para todos – por que não teríamos que fazê-lo, todos os demais? Então, você crê que se fosse cometer um ato que tem a tendência de destruir a Igreja visível de Deus, seria tão bom cristão como se fizesse o mais que pudesse para edificar essa Igreja? Eu não creio nisso, amigo! Nem você tampouco. Você não crê em tal coisa: trata-se somente de uma desculpa enganosa para esconder algo mais.

Ali está um ladrilho, e isso é muito bom. Para que esse ladrilho está montado? Para ajudar a construir uma casa com ele. Não tem caso que esse ladrilho lhe diga que é tão bom ladrilho enquanto esteja posto no chão como se estivesse na casa. É um ladrilho que não serve para nada; não serve enquanto não seja colocado na parede. De igual maneira, vocês, cristãos vagabundos, eu não creio que vocês estejam cumprindo seu propósito; estão vivendo contrariamente à vida que Cristo quer que vivam, e devem ser culpados em grande medida pelo dano que fazem.

“Ó” – um diz – “ainda espero que amo ao Senhor, se eu fosse me unir à Igreja, eu sentiria que é uma grande atadura para mim”. É justo o que deveria sentir. Você não deveria sentir que está ligado à santidade agora, e ligado a Cristo agora? Ó, essas benditas ataduras! Se existe algo que pudesse me fazer sentir mais ligado à santidade do que estou, eu gostaria de sentir esses grilhões, pois se sentir ligado à santidade não é outra coisa que liberdade, retidão e solicitude de vida.

“Ó” – diz outro – “se eu me unisse à Igreja, temo que não seria capaz de persistir”. Você espera persistir, suponho, fora da Igreja; quer dizer, você se sente mais seguro desobedecendo a Cristo do que o obedecendo! Que estranho sentimento é esse! Ó, seria melhor que fosse e dissesse: “meu Senhor, eu sei que teus santos devem estar unidos na comunhão da Igreja, pois as igrejas foram instituídas por Teus apóstolos, e eu confio que tenho graça para cumprir com essa obrigação; não tenho nenhuma força própria, meu Senhor, mas minha força radica em apoiar-me em Ti; irei onde Tu me guies, e tudo o mais deixarei em Tuas mãos”.

“Ah, mas” – diz outro – “eu não posso me unir à Igreja; ela é tão imperfeita”. Então, você é perfeito, é claro! Se é assim, aconselho-o que se vá para o céu, e se una lá à Igreja, pois certamente você não é idôneo para se unir a ela na terra, e você estaria fora de seu lugar.

“Sim” – diz outro – “mas eu vejo que os cristãos possuem muitas coisas más”, e não existe nada mau em você mesmo, suponho! Eu só posso dizer, meus irmãos, que se a Igreja de Deus não é melhor do que eu sou, sinto muito. Quando eu me uni à Igreja, eu senti que receberia muito mais bem do que eu poderia retribuir-lhe, e com todas as falhas que vi ao viver esses vinte anos ou mais na Igreja cristã, posso dizer-lhes, como homem honesto, que os membros da igreja são os excelentes da terra, nos quais está todo o meu deleite, ainda que não sejam perfeitos, e realmente estejam a grande distância de o serem. Se fora do céu fosse buscado alguém que realmente viva perto de Deus, esses são os membros da Igreja de Cristo.

“Ah” – diz outro – “mas existem muitos hipócritas”. Você mesmo é muito cabal e sincero, suponho. Confio que o seja, mas então, deveria vir e unir-se à Igreja, para aumentar a integridade dela por meio da sua.

Estou seguro, meus queridos amigos, de que nenhum de vocês fecharia sua loja, amanhã pela manhã, ou recusaria aceitar qualquer moeda de ouro, quando algum cliente lhes fosse pagar algo, só porque existem alguns falsificadores que estão pagando com moedas de ouro falsas. Não, vocês não fariam isso, e vocês não acreditam na teoria de certas pessoas de que devido a que alguns cristãos professos são hipócritas, então, todos os cristão o são, pois isso seria como se fosse dito que porque algumas moedas de ouro são falsas, então, todas as moedas de ouro são falsas, o que seria claramente um erro, pois se todas as moedas de ouro fossem falsas, não seria negócio para o falsificador apresentar suas moedas falsificadas: as moedas falsas só são de valor quando a quantidade de bom material excede o mau material. Existe ainda muito boa quantidade de respeitáveis cristãos de ouro no mundo e inclusive ainda na Igreja, e podem estar certos disso.

“Bem” – diz alguém – “eu não creio – ainda que espero ser um servo de Deus – que eu possa me unir à Igreja; verá, ela é muito desprezada”. Ó, que bendito desprezo é esse. Eu em verdade creio, irmãos, que não existe honra no mundo que se equipare ao de ser desprezado pelo que se dá em chamar “Sociedade” nesse país. A maioria das pessoas são escravas do que chamam “Respeitabilidade”. Respeitabilidade! Quando um homem coloca no dia de Domingo um abrigo que comprou com seu dinheiro; quando adora a Deus pela noite ou durante o dia, quer seja que os homens o vejam ou não: quando é um homem honesto e íntegro – não me importa que baixos sejam seus rendimentos – ele é um homem respeitável, e não deve dobrar seu pescoço diante da ideia da Sociedade ou de sua respeitabilidade artificial.

Esses diversos tipos de farsantes, pois não são outra coisa, impedem que muitos se unam à Igreja cristã, porque têm medo de serem desprezados pela gente respeitável da Sociedade. Precisamente ontem, li em um periódico que não serviria de nada criar membros da nobreza não conformistas, para que se voltassem respeitáveis em sua religião, porque na seguinte geração deixará de existir não conformistas, e temo que é verdade! É terrível que tão logo como algumas pessoas se elevam em sua posição social, renunciam à Igreja, a qual se entregaram quando se consagraram ao Senhor. O dia chegará quando os cristãos mais pobres serão exaltados acima dos nobres mais altivos que não temeram ao Senhor; quando Deus tome das miseráveis casas e barracas de Londres, uma nobreza de uma raça imperial que fará enrubescer a todos os reis e príncipes do mundo. E a esses os porá por cima dos serafins, enquanto outros serão lançados fora de Sua presença.

Eu digo a qualquer de vocês que não queira se unir à Igreja porque fazê-lo rebaixaria sua respeitabilidade: tampouco eu lhe peço que se una a ela, nem tampouco Cristo o pede: se a Sociedade e a Respeitabilidade são os deuses que você adora, acuda a seus deuses miseráveis e a adorá-los, mas Deus o requererá de suas mãos no dia do acerto das contas. Não existe nada melhor que o serviço de Cristo.

No que a mim diz respeito e se o serviço de Cristo o requer, aceito ser desprezado, ser apontado, ser vaiado nas ruas, ser chamado de todos os tipos de apelidos, e prefiro isso a todas as estrelas das ordens de cavalaria e dignidades da nobreza, pois essa é a verdadeira honra do cristão quando serve verdadeiramente a seu Senhor.

Vem o dia em que o Senhor fará uma divisão entre aqueles que O amam e aqueles que não O amam, e cada dia se está alistando para essa última divisão. Nesta mesma noite, essa divisão está sendo realizada; na pregação do Evangelho se está implementando. Que cada homem tome sua posição, e se faça a pergunta: está com Cristo ou com Belial? Está com Deus, com Cristo, com o sangue precioso, ou ainda está no nível dos prazeres pecaminosos e seus deleites? Como você terá que responder por eles quando os céus estejam ardendo, e a terra estremeça, e a trombeta do juízo o convoque diante do grande trono branco, então, dê conta disso agora!

E vocês, espíritos valorosos, que amaram o seu Salvador, se jamais se uniram ao Seu exército, venham e alistem-se agora. E vocês, espíritos amantes, que são ternos, e que retrocederam por um tempo, passem para frente agora –

 

“Vocês que são homens agora sirvam-no,

Contra incontáveis inimigos.

Seu valor cresça com o perigo,

E à força oponham força.”

 

Hoje, apoiem Jesus: hoje, estejam dispostos a ser a escória de todas as coisas por causa de Seu nome; e logo, quando Ele venha na glória, a recompensa será sua, uma recompensa que suplantará todas as perdas que vocês poderiam experimentar hoje.

“Aquele que crer e for batizado será salvo”. “O que crê em seu coração, e confessa com sua boca, será salvo”. Crê no Senhor Jesus Cristo, e que Sua benção descanse sobre você. Amém.

 

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ORE PARA QUE O ESPÍRITO SANTO USE ESSE SERMÃO PARA TRAZER UM CONHECIMENTO SALVÍFICO DE JESUS CRISTO E PARA EDIFICAÇÃO DA IGREJA

FONTE: Traduzido de http://www.spurgeon.com.mx/sermon3411.html

Todo direito de tradução protegido por lei internacional de domínio público e com autorização de Allan Roman.

Sermão nº 3411 — Volume 60 do The Metropolitan Tabernacle Pulpit,

Tradução: Armando Marcos

Revisão: Cibele Cardozo

Capa: Victor Silva